
Livro simples, seco, directo, contido, breve. Constrói uma crítica arrasadora a uma sociedade que mastiga seres humanos, ou, se se quiser, em que mastigar seres humanos faz parte do processo do viver. Processo em que, além de se descartar o indivíduo, se constroem verdades pronto-a-vestir em que há procedimentos e mecanismos que promovem difamação e formas de violência psicológica perfeitamente aceitáveis numa sociedade democrática. A situação é, infelizmente, de uma actualidade de tirar o fôlego, é impossível não reconhecermos nesta sociedade a nossa sociedade das informações falsas que circulam sem qualquer feed-back, e onde cada grupo, pessoa, instituição, tem os seus objectivos e tudo faz para os atingir. Claro que o prémio para o desempenho mais abjecto, roçando o surrealista, vai para o jornal Zeitung.
A escrita seca, depurada, ao estilo de um documentário, aparentemente objectivo, descrevendo sem emoções os acontecimentos, contrasta com a riqueza da realidade emocional e, já agora, com a vulnerabilidade e integridade da personagem principal que é visceralmente dissecada, interpretada e, sobretudo, coisificada. E que no fim se revolta e, por paradoxal que pareça, mata por dignidade. Contradições que uma sociedade que não perde tempo a pensar nas consequências pode provocar, há sementes de violência que nascem da defesa do que há de mais sagrado em nós. Sinceramente, só posso dizer, hoje em dia ainda é pior.